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Arquitetura Áulica | Chalet Biester

Chalet Biester

Chalet Biester

O primeiro chalé que se conhece em Portugal foi construído, em 1869, na extremidade meridional do magnífico Parque da Pena para a Condessa d`Edla. Projetado pela própria e inspirado na arquitetura da América do Norte, foi oferecido por D. Fernando II de Saxe-Coburgo, viúvo de D. Maria II, à Condessa d`Edla no mesmo ano em que casaram. A partir daqui a nobreza e a burguesia da alta finança aderem à moda dos chalés e começaram a construir estruturas semelhantes.

A costa do Estoril era por excelência um dos sítios mais apreciados na época sobretudo devido ao clima e à proximidade com Lisboa. A costa do Estoril tornou-se então um local privilegiado para os mais abastados aí passarem as suas vilegiaturas, ou parte delas, tão apreciadas na Europa da época. O clima que a parte meridional do continente europeu oferece é propício a temporadas de veraneio e, sobretudo no século XIX, até mesmo a digressões pelas várias estâncias turísticas da moda para as bolsas mais endinheiradas.

A costa do Estoril e de Cascais foi um dos locais onde, aqui e ali, começaram a nascer chalés com tetos negros e inclinados que nos remetem de imediato para a construção transalpina. Contudo não houve uma tentativa deliberada de imitar a arquitetura deste ponto da Europa, acreditamos antes que se deve ao primeiro exemplar construído na costa de Cascais, edificado segundo encomenda do Duque de Palmela, em 1873, sobre o antigo Forte da Conceição e arquitetado segundo traços do então presidente do Royal Institute of British Architects, Thomas Henry Wyatt. Sem o prever o arquiteto influenciou grande parte da arquitetura da zona no final da centúria de oitocentos.

O Chalé Biester, que adotou o nome do seu proprietário, surge na sequência das construções apalaçadas construídas na linha do Estoril no último quartel de oitocentos, quando Frederico Biester encomendou a obra ao arquiteto José Luís Monteiro.

José Luís Monteiro (1848-1942) foi um dos mais destacados e importantes arquitetos do seu tempo. Nasceu em Lisboa e, em 1868, terminou o curso na Academia Real de Belas Artes de Lisboa. Cinco anos mais tarde, partiu para Paris como bolseiro e diplomou-se em arquitetura na École Nationale et Spéciale des Beaux Arts sob a orientação, por sua opção, do professor Jean-Louis Pascal, especializado na gramática clássica greco-romana. A opção por este professor foi de uma importância capital para a formação do jovem arquiteto. Após terminar os estudos fez um tour pelo centro sul da Europa. Visitou, durante cerca de um ano, várias partes da França, Suíça e Itália, com particular destaque para a zona transalpina. O facto de ser o primeiro português a obter uma pós-graduação em arquitetura fora do País, valeu-lhe a consideração e as encomendas das classes mais abastadas do Reino. Foram muitas as solicitações e entre as suas obras mais importantes destacamos a estação do Rossio, o Hotel Avenida Palace, o edifício para a sede do antigo Banco Lisboa e Açores (atual Santander) e o Palácio do Conde de Castro Guimarães. Introdutor da arquitetura do ferro em Portugal, convém não esquecer que Paris foi uma das cidades pioneiras na utilização desta matéria prima, destacando-se a cobertura da área de embarque da estação do rossio, em Lisboa. Na fachada da estação, observamos uma gramática de vincado sabor gótico-manuelino, aliás, várias vezes recorreu aos elementos góticos para desenvolver diversas estruturas. Talvez por influência parisiense, do seu mestre Pascal ou, mais provavelmente, do teórico John Ruskin que defendia o estilo gótico com muita convicção.

Assim, o Chalé Biester só poderia resultar numa obra de primeiríssima água. Pelo local escolhido para a construção, a encosta norte da serra de Sintra, e o destacado arquiteto, não exigia menos que uma obra de arte de grande qualidade. Mais uma vez, Sintra e a sua serra, levam-nos para um mundo de fantasia, um mundo encantado que nos é difícil de aceitar como uma realidade. Apresentando um conjunto de volumetrias invulgares na arquitetura da região, o palácio, parece fazer parte de um cenário imaginário, de uma ópera ou de um filme de suspense. É irreal. Os telhados negros e íngremes rematados por um friso metálico – que nos conduz de imediato para a zona transalpina – e a sobriedade das linhas exteriores contrastam, por vezes, com elementos como a torre, onde se rasgam duas imponentes janelas verticais neogóticas protegidas por vitrais, também eles neogóticos e de temática cristã e geométrica. José Luís Monteiro escolheu alguns dos melhores artistas para trabalhar e decorar o interior da sua casa, reforçando assim a qualidade do conjunto: o reputado cenógrafo italiano Luigi Manini, que trabalhou nas obras do Hotel Palácio do Buçaco e ainda como cenógrafo do Real Teatro de São Carlos em Lisboa e amigo pessoal de D. Fernando II; Rafael Bordalo Pinheiro (azulejaria); Paul Baudry (frescos); e Leandro Braga (escultura e móveis).

O resultado é um verdadeiro cenário romântico. A escadaria de acesso ao primeiro andar, em estilo neogótico apresenta um misto de arcos trilobados e elementos de arte nova. Aliás esta fórmula repete-se em praticamente toda a estrutura neogótico/arte nova. Dentro do gótico refletem-se as influências do estilo internacional e flamejante. As paredes revestem-se de frescos representando elementos fitomórficos, geometrizantes ou de figuras várias representantes da corte celestial como querubins e outros seres antropomórficos. A capela, igualmente em estilo neogótico, apresenta no torreão da capela-mor quatro vitrais policromados que representam no primeiro registo elementos geométricos e no segundo os quatro evangelhos. De destacar, ainda, a abóbada do torreão, estruturalmente bem lançada e sustentada por um jogo de nervuras assentes em simples mísulas. Lambrins e tetos em madeira trabalhados ao detalhe, frescos nas paredes e nos tetos, azulejos e outros elementos decorativos orgânicos contribuem para um efeito cenográfico digno de destaque. Quase podemos dizer que, tal como, no período barroco, existe um horror ao vazio. Toda a estrutura arquitetónica encontra-se repleta de formas orgânicas que aludem a movimento e fluidez.